
Tenho buscado a alienação.
A busca do não saber.
Tento não me envolver, evitar falar, comentar, conversar sobre.
É um esforço de autopreservação, uma tentativa de manter a sanidade psíquica e a amizade com quem defende o que enxergo como barbárie e o fracasso do Estado Democrático de Direito.
Vivemos em uma sociedade onde o mínimo é negado a quem mais risco corre.
O risco de enveredar pela via da bandidagem, nas fileiras do Comando Vermelho, do PCC, das milícias e de tantas outras facções, ou o risco de simplesmente não poder viver em outro lugar que não as regiões dominadas pela criminalidade.
Dói ver e ouvir quem justifica tamanha maldade.
Dói saber e sentir que tão poucos se colocam no lugar da mãe, do pai, do filho ou do cônjuge enlutado pelas mãos do próprio Estado, o mesmo Estado que deveria protegê-los.
A ausência de um poder público comprometido com a infância, a educação, a geração de renda, a equidade e a justiça social nos empurra, inevitavelmente, para o abismo.
E o que nos espera é mais dor, mais medo, mais revanchismo.
Ao fim, só se colhe o mal que se semeia.
Enquanto isso, os verdadeiros operadores internacionais do tráfico de drogas e de armas seguem intocados, abrigados em seus arranha-céus, nos bairros onde jamais se ouvirá um tiro disparado pelas forças do Estado.
Eles se encontram entre nossos parlamentares, nos banquetes de palácios e nos salões de governo.
Muitas vezes, são os próprios governantes.
Dói o ontem.
Dói o hoje.
E o que mais dói é a triste certeza de que nada está sendo feito por um amanhã diferente.
Por Érico Santos



